terça-feira, 19 de dezembro de 2017

«Um grande livro, escrito por um grande pensador, é um navio de pensamentos, com o porão carregado de verdade e beleza.»
Pablo Neruda<iframe src="https://www.facebook.com/plugins/video.php?href=https%3A%2F%2Fwww.facebook.com%2F116621318351011%2Fvideos%2F196244000418099%2F&show_text=0&width=560" width="560" height="413" style="border:none;overflow:hidden" scrolling="no" frameborder="0" allowTransparency="true" allowFullScreen="true"></iframe>

 O que me dói não é

O que me dói não é 

O que há no coração 
Mas essas coisas lindas 
Que nunca existirão... 

São as formas sem forma 
Que passam sem que a dor 
As possa conhecer 
Ou as sonhar o amor. 

São como se a tristeza 
Fosse árvore e, uma a uma, 
Caíssem suas folhas 
Entre o vestígio e a bruma. 

Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"



ANTERO DE QUENTAL, in SONETOS (Verbo, 2005)

AMOR VIVO


Amar! mas dum amor que tenha vida...
Não sejam sempre só delírios e desejos
Duma douda cabeça ensandecida...

Amor que viva e brilhe! luz fundida
Que penetre o meu ser - e não só beijos
Dados no ar - delírios e desejos -
mas amor... dos amores que têm vida...

Sim, vivo e quente! e já a luz do dia
Não virá dissipá-lo nos meus braços
Como névia da vaga fantasia...

Nem murchará do sol à chama erguida...
Pois que podem os astros dos espaços
Contra uns débeis amores... se têm vida?



ALEXANDRE O'NEILL, in POESIAS COMPLETAS 1951/1986 (INCM, 3ª ed., 1995)

HÁ PALAVRAS QUE NOS BEIJAM


Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca.
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.

Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto;
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.

De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas inesperadas
Como a poesia ou o amor.

(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído
No papel abandonado)

Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.



"Se tu viesses ver-me hoje à tardinha, 
A essa hora dos mágicos cansaços, 
Quando a noite de manso se avizinha, 

E me prendesses toda nos teus braços."

Florbela Espanca




Procuro-te
Procuro a ternura súbita, 
os olhos ou o sol por nascer 

do tamanho do mundo, 
o sangue que nenhuma espada viu, 
o ar onde a respiração é doce, 
um pássaro no bosque 
com a forma de um grito de alegria. 

Oh, a carícia da terra, 
a juventude suspensa, 
a fugidia voz da água entre o azul 
do prado e de um corpo estendido. 

Procuro-te: fruto ou nuvem ou música. 
Chamo por ti, e o teu nome ilumina 
as coisas mais simples: 
o pão e a água, 
a cama e a mesa, 
os pequenos e dóceis animais, 
onde também quero que chegue 
o meu canto e a manhã de maio. 

Um pássaro e um navio são a mesma coisa 
quando te procuro de rosto cravado na luz. 
Eu sei que há diferenças, 
mas não quando se ama, 
não quando apertamos contra o peito 
uma flor ávida de orvalho. 

Ter só dedos e dentes é muito triste: 
dedos para amortalhar crianças, 
dentes para roer a solidão, 
enquanto o verão pinta de azul o céu 
e o mar é devassado pelas estrelas. 

Porém eu procuro-te. 
Antes que a morte se aproxime, procuro-te. 
Nas ruas, nos barcos, na cama, 
com amor, com ódio, ao sol, à chuva, 
de noite, de dia, triste, alegre — procuro-te. 

Eugénio de Andrade, in "As Palavras Interditas"



Assim o Amor
Assim o amor 
Espantado meu olhar com teus cabelos 

Espantado meu olhar com teus cavalos 
E grandes praias fluidas avenidas 
Tardes que oscilam demoradas 
E um confuso rumor de obscuras vidas 
E o tempo sentado no limiar dos campos 
Com seu fuso sua faca e seus novelos 

Em vão busquei eterna luz precisa 

Sophia de Mello Breyner Andresen, in “Obra Poética”



... Estas reticências demonstram a infinidade de génios portugueses e o quão difícil se torna seleccioná-los. Como um livro aberto cabe a cada um de nós preencher as páginas, dia após dia, com todos eles ,nas várias temáticas que abordam e não só no género lírico.

Sem comentários:

Enviar um comentário